SILÊNCIOS

Uma das bases mais sólidas de qualquer democracia moderna é a existência de uma comunicação social livre e sem censura. Vivemos, desde 25 de Abril de 1974, nessa situação.
Os jornalistas e os seus orgãos de informação têm investigado e denunciado abusos de poder, actos ilícitos de ministros e outros políticos, casos suspeitos de corrupção. Têm sido, numa palavra, um verdadeiro e saudável «quarto poder» em Portugal.
Acontece que, cada vez com mais frequência, estas situações tendem a ser substituídas por ondas de intenso «ruído» seguidas por prolongados silêncios.
Explico melhor: durante uma ou duas semanas, as primeiras páginas dos jornais avançam com manchetes fortes, os telejornais procuram ser os primeiros a trazer mais novidades sobre o «Caso A» ou sobre o «Caso B». Mas esta azáfama desaparece, pouco depois, como se o silêncio fosse a lei do mais forte. As notícias sobre o assunto deixam as primeiras páginas da imprensa, as televisões mostram mais uma catástrofe na Coreia do Sul…
Neste contexto, a minha interrogação-provocação-preocupação é a seguinte: porque será que os jornalistas abandonam o tratamento dos temas mais escaldantes?

Duas hipóteses:

1. Será porque deixam de ser interessantes do ponto de vista das audiências (matéria muito sensível, designadamente nas televisões)? Nesta hipótese, podemos concluir que a informação-espectáculo produzida não permite o aprofundamento das notícias, reduzida que está à ditadura das audiências.

2. Ou será porque são «aconselhados» a não prosseguir nas suas investigações?

Qualquer destas duas hipóteses (embora, talvez, outras existam) deixam-me seriamente preocupado. Durante anos, como cidadão, sempre acreditei no papel regulador e vigilante que a comunicação social deveria ter na sociedade e na vida política.
Se, hoje, esse papel já não pode ser desempenhado, que nos resta? Que podemos nós fazer?