Europa: Duas ideias

1.
Lembro-me frequentemente desta história: foi em Nova York que me apercebi, pela primeira vez, que era um cidadão europeu. Pode parecer estranho mas é verdade. Somos muito diferentes dos americanos em muitas coisas e somos mais parecidos com os nossos parceiros europeus.
Isto não significa que não haja grandes diferenças entre um francês e um português, entre um alemão e um italiano ou entre um holandês e um espanhol.
Mas, temos algo de muito mais profundo que nos une. A começar (e talvez o mais importante) o facto de reconhecermos a diferença e a respeitarmos.
Reconhecemos (e valorizamos) as diferenças e encaramos esse facto como uma mais-valia. Como algo de natural porque, no essencial, a Europa e os europeus têm uma tradição democrática e de respeito por valores de solidariedade, de tolerância, de abertura e de partilha.
Essa matriz europeia que é partilhada por milhões de cidadãos está hoje a ser posta em causa pelos populistas e pelos ideias da extrema-direita xenófoba. Ao contrário do que apregoam, estes protagonistas não estão a lutar por mais Europa mas sim a desejar uma nova realidade em que a Europa se distancie da sua essência. Não estão a querer (re)construir a Europa supostamente ameaçada. Estão a querer fechar um espaço que é um espaço de liberdade e tolerância. Uma terra de oportunidades para os que a não têm. Por isso, a saga populista e xenófoba que desperta é uma das principais ameaças à Europa que construímos. E por isso tem de ser combatida com firmeza.

2.
Uma segunda ideia que anda no ar: o afastamento dos cidadãos europeus da Europa e do ideal europeu. Penso que essa é um dos maiores equívocos da actualidade. E é um equívoco que está a ser estimulado, em primeiro lugar, pelos inimigos da Europa e os que desejam a sua desintegração para conquistarem vantagem na pequenez dos seus territórios atrás de muros aparentemente protectores.
O que se passa realmente é um afastamento em relação à deriva inconcebível dos burocratas de Bruxelas que estão a querer impor uma União Europeia contra... a Europa.
Quando se quer construir uma nova realidade contra a vontade dos povos e à revelia da sua essência estruturada em torno de uma longa história comum, tudo só pode correr mal.
A Europa vive em paz há de 70 anos afirmando-se como um espaço de prosperidade, tolerância, desenvolvimento e solidariedade.
Infelizmente, nem sempre os decisores da União Europeia contribuem para que essa realidade se afirme e se reforce.
Esse é um erro colossal e pode sair muito caro a todos nós.
Pela Europa, pelos seus princípios e pela sua tradição, será fácil congregar esforços e pessoas. Esse é o caminho.
Setembro/2019

Publicado no Nº 11 da revista "Sem Equívocos"