“Todo o homem é mais parecido com a sua época do que com o
seu pai.”
Provérbio Árabe
1. APRESSADOS
O nosso tempo é, sem dúvida, um tempo em que a rapidez se
tornou regra: queremos tudo agora, já ou de imediato. A pressa tomou conta de
tudo, da comida (fast-food) à velocidade a que acedemos à Internet. Tudo se
mede em minutos ou mesmo em segundos. E quem se atrasa está (parece estar...)
perdido.
A velocidade a que estamos a evoluir é excelente. No
entanto, esta mesma velocidade está a retirar-nos o prazer de estar e de ser.
Se tudo é tão rápido, não temos sequer tempo para ver ou sentir e, muito menos,
saborear. Não temos tempo para preservar a memória (deixamos que um disco
externo se encarregue disso).
Esse é o nosso tempo e já pouco podemos fazer. A não ser
resistir e ter a capacidade de abrandar o ritmo, de esperar um pouco, de andar
mais devagar ou de recusar comer uma refeição em pé. São gestos simples e que
dependem apenas de nós.
2. LIGADOS
O nosso tempo é, sem dúvida, um tempo em que não conseguimos
estar desligados. Estamos a olha para o telemóvel centenas de vezes por dia.
Acedemos dezenas de vezes ao Facebook. Respondemos a inúmeras mensagens de
texto ao mesmo tempo que conduzimos. A nossa aplicação de email interrompe-nos
constantemente com a chegada de novas mensagens. Numa conversa, se surge uma
dúvida sobre uma data ou um lugar, já não apelamos à memória e procuramos na
Internet. E podia continuar a desfiar um conjunto imenso de situações em que já
não conseguimos estar desligados.
Esse é o nosso tempo e já pouco podemos fazer. A não ser
resistir e ter a capacidade de deixar o telefone em silêncio durante uma parte
do dia, ajustar uma hora para consulta de informação online ou guardar uns
momentos para estar bem (lendo um livro, passeando, conversando). São gestos
simples e que dependem apenas de nós.
3. PARECIDOS
O nosso tempo é, sem dúvida, um tempo em que somos mais
globais e em que cada vez mais estamos sujeitos a influências e a contextos
muito semelhantes, designadamente no acesso a informação. Estamos, também muito
expostos a verdadeiras máquinas de comunicação de origens diversas mas sempre
com a mesma intenção: controlar o que sabemos e, depois, influenciar o que
pensamos e como pensamos.
Pior ainda se pensarmos que muita da informação que
recebemos ou a que acedemos já está condicionada por algoritmos de motores de
pesquisa e outras formas de condicionamento. Daí resulta que estejamos cada vez
mais parecidos. Com mais acesso a informação mas, provavelmente, com menos
liberdade de escolha. Provavelmente, o excesso de informação de que somos
vítimas em vez de ser benéfico pode talvez ser prejudicial.
Como temos tanta informação para ler e reflectir, poderá
dar-se o caso de com essa ilusão de liberdade de acesso a informação nos escape
que estamos condicionados e manipulados.
Claro que podemos também produzir informação (nunca foi tão
fácil escrever e publicar). Podemos escolher fontes que sejam mais credíveis
(nunca foi tão fácil aceder a milhões de ficheiros de múltiplas procedências).
Podemos fazer tudo isso. Mas continuamos a abrir a caixa de pesquisa do Google
para o que devia ser um ponto de partida numa pesquisa cuidadosa, aprofundada e
criteriosa.
Mas, como estamos apressados e vivemos permanentemente
ligados, muitas vezes (ou sempre?) não temos tempo ou já nem nos damos a esse
trabalho...
Esse é o nosso tempo e já pouco podemos fazer. A não ser
resistir e ter a capacidade de pesquisar diversas fontes e avaliar a sua
credibilidade, ler opiniões contraditórias, explorar factos mesmo os que não
confirmam as nossas convicções, estar alerta para as manipulações que nos
entram pela porta dentro.
Numa palavra: pensar. Numa atitude: ter dúvidas. Num
princípio: ser exigente.
São gestos simples e que dependem apenas de nós.
Novembro/2017
__________
Publicado no Nº 4 da revista "Sem Equívocos"