POR-TU-GAL! POR-TU-GAL!

Agora que já fomos campeões europeus e estamos, novamente, numa fase final do Campeonato do Mundo, a recordação desse jogo é ainda mais significativa: em 1974, um empate sabia a vitória e nós vivíamos esse resultado com orgulho.

Ano: 1974

Em 20 de Novembro de 1974, assisti na televisão a um jogo de futebol transmitido a partir do Estádio de Wembley: Inglaterra-Portugal. Resultado final: Zero-Zero. Lembro-me como fiquei empolgado com um… empate que considerei um feito, sobretudo jogando a selecção nacional em casa do adversário.
Agora que já fomos campeões europeus e estamos, novamente, numa fase final do Campeonato do Mundo, a recordação desse jogo é ainda mais significativa: em 1974, um empate sabia a vitória e nós vivíamos esse resultado com orgulho.
Hoje, ambicionamos muito mais. Passados 44 anos, queremos ser campeões do mundo e no discurso oficial dizemos: “não somos favoritos mas somos candidatos”.

Ano: 1998

Em 1998, construímos e vivemos um momento alto do nosso século XX: a Expo’98. Foram meses em que provámos, em primeiro lugar a nós próprios, que tínhamos evoluído e muito. Que podíamos ambicionar ser uma peça importante no mundo apesar da nossa reduzida dimensão territorial. Que éramos capazes de organizar (e viver) uma exposição de nível mundial.
Desses meses guardo uma memória viva e alargada. Mas, recordo um momento que durou escassos minutos mas que me marcou pelo seu significado simbólico e que ultrapassou em muito o momento.
No dia do encerramento da Expo’98, estiveram no recinto cerca de 300 mil pessoas. Com um ambiente feliz mas já nostálgico daqueles meses que queríamos perpetuar, fomos até ao espaço em que, todos os dias, tinha lugar um espectáculo pirotécnico no rio Tejo. Nesse último dia, como momento final que se queria memorável, o espectáculo foi ainda mais intenso. Terá durado uns dez minutos e, no fim, aconteceu algo de mágico, espontâneo e imediato. Uns brevíssimos segundos depois do fim do espectáculo, milhares e milhares de pessoas gritaram a plenos pulmões: Por-tu-gal! Por-tu-gal!
Por uns momentos, fomos um povo unido, mostrámos o nosso orgulho e vibrámos com o imenso sucesso que nós, Portugueses, tínhamos construído e de que a Expo’98 tinha sido uma excelente exemplo. Nesse dia, estivemos no futuro que queríamos viver.

Ano: 2004

O ano em que organizámos o Campeonato Europeu de Futebol e tivemos uma das maiores desilusões da vida: perder no Estádio da Luz.  Tinham passado 30 anos sobre o jogo em Wembley.
Nesse ano mágico, as bandeiras nacionais e uma imensa alegria desceram às ruas de todo o país. Jogo após jogo, mais entusiasmo e mais resultados. Dia após dia, mais e mais portugueses nos sentíamos.
Tal como na Expo’98, estivemos além do nosso tempo, desafiámos o triste fado das vitórias morais. Perdemos? Sim, perdemos a final. Mas, provavelmente, ganhámos muito mais do que isso: auto-estima, determinação e vontade.

Ano: 2018

Nesta crónica, ao relembrar estes momentos quis, sobretudo, sublinhar que nós podemos ser o povo do pessimismo, que não valoriza o que tem de melhor. O povo e o país que ainda tem muito que melhorar, crescer e desenvolver.
Mas, é bom que não esqueçamos estes (e vários outros) momentos em que nos transcendemos. E em que tivemos muitas pessoas de que só nos podemos orgulhar. Recordo o nome de uma dúzia de portugueses que nos fazem sentir da dimensão do mundo e do tamanho da ambição que quisermos ter: José Saramago e Gonçalo M. Tavares; Siza Vieira e Souto Moura; Fernando Gil e Eduardo Lourenço; Carlos Lopes, Rosa Mota, Cristiano Ronaldo e José Mourinho; Júlio Pomar e Nadir Afonso.
E recordo ainda o 25 de Abril que nos trouxe a liberdade e muito mais.
Quando, hoje, ouvimos (e cantamos) o hino nacional sabemos que podemos perder o jogo. Mas, ao contrário de 1974, sobretudo sabemos que vamos jogar para ganhar. O futebol também é isso mesmo: o rosto de um povo forte com uma história de centenas de anos. E com futuro, apesar dos tempos difíceis que vivemos e dos inúmeros problemas que continuam por resolver.

(in Jornal Tornado, 15/06/2018)